Links úteis:

Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (UFRGS)

SIRIEMA - Spatial Evaluation of Road Mortality Software

REET Brasil - Rede Brasileira de Especialistas em Ecologia de Transportes

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA

 

 

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1.4. AVALIAÇÃO DOS IMPACTOS AMBIENTAIS: TOMADA DE DECISÃO

A avaliação de quanto um impacto ambiental é significativo carrega muito de subjetividade, pois o grau em que uma alteração ambiental (impacto) pode ser tolerada depende muito dos valores e conceitos de quem analisa a situação (SÁNCHEZ 2008). “Qual o número de mortes que uma espécie pode suportar sem consequências significativas para sua conservação?” é uma questão biológica essencial para avaliar a necessidade e o grau de mitigação de uma obra rodoviária, porém de difícil resposta (SEILER & HELLDIN 2006).

Além da perspectiva biológica propriamente dita, fatores legais, econômicos, de segurança do tráfego, éticos e relacionados à política ambiental também devem ser considerados (SEILER & HELLDIN 2006). Embora todos devam ser pesados e considerados na tomada de decisão, o presente trabalho tem como foco principal o processo envolvido na avaliação do impacto e tomada de decisão sob as perspectivas biológica e ecológica, provavelmente aquelas com maior grau de incerteza e relevância. Um diagnóstico contendo informações qualitativas e quantitativas objetivas e confiáveis facilita sobremaneira a tomada de decisão no âmbito do licenciamento da rodovia, momento em que o órgão ambiental deve decidir quais medidas devem ser adotadas para neutralizar, mitigar ou compensar os danos ambientais. Nos casos em que é viável técnica e economicamente a neutralização, teoricamente o impacto não ocorrerá, devendo ser executado apenas o monitoramento da operação do empreendimento para constatar a eficácia da alternativa adotada. Para os impactos inevitáveis, a compensação ambiental, inerente aos processos de licenciamento ambiental baseados em Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e financiada pelo empreendedor, é a contrapartida, prevista pela legislação, ao dano.

Reunidos os dados do projeto e do diagnóstico efetuado para subsidiar a análise do licenciamento prévio, o órgão licenciador deve ser capaz de verificar se foram identificados corretamente os trechos prioritários, os grupos animais de interesse, a dimensão dos impactos sobre a fauna, e finalmente propostas as medidas mitigadoras mais adequadas. É necessário que, além da visão específica do empreendimento em foco, o gestor ambiental o contextualize em relação ao restante da malha viária, situação dos ecossistemas regionais e estado de conservação das espécies. Um Sistema de Informações Geográficas consistente deve ser mantido pelo órgão ambiental, servindo tanto como elemento de verificação de informações apresentadas nos estudos ambientais quanto para a formação de um quadro em menor escala que contextualize o empreendimento. Informações úteis e disponíveis em várias fontes incluem modelos digitais de elevação do terreno (dados da Shuttle Radar Topography Mission são disponibilizados gratuitamente pela NASA, em https://srtm.usgs.gov/), mapas hidrológicos e de vegetação, áreas prioritárias para conservação da biodiversidade (https://mapas.mma.gov.br/i3geo/datadownload.htm) e sistemas viários existentes.

As principais perguntas a serem respondidas dentro da perspectiva biológica do processo de tomada de decisão (Figura 9), com base nas informações reunidas e no conhecimento acumulado sobre o assunto, são:

a. Qual a magnitude prevista dos impactos sobre a fauna?

b. Há como classificar espacial e temporalmente os impactos?

c. Qual a medida mais adequada para propiciar a mitigação?

d. Qual o efetivo impacto da rodovia e a eficácia das medidas adotadas?

Figura 9. Fluxograma básico para tomada de decisão referente aos impactos das rodovias sobre a fauna, com ênfase na perspectiva biológica. Excetuando a perspectiva legal, as demais (segurança, ética e biológica) não obedecem a uma classificação hierárquica.

Respondidos os dois primeiros questionamentos, deve ser delineada a medida mais efetiva para reduzir o impacto sobre a fauna. A experiência acumulada ao longo das últimas décadas e registrada na literatura indica que algumas das alternativas conhecidas têm melhores resultados para grupos específicos de animais, para condições topográficas particulares, ou apresentam uma relação custo-benefício que não guarda razoabilidade com o impacto previsto. O item 2. Medidas mitigadoras apresenta a descrição e indicação das alternativas levantadas por meio de extensa revisão bibliográfica, sendo essencial que todos os técnicos envolvidos no processo (consultores, executores e gestores) tenham conhecimento de suas características.

Para que seja selecionado o dispositivo adequado, é necessário que, anteriormente, seja identificada qual estratégia se pretende adotar, em função dos efeitos mais relevantes previstos. Para isso, deve ser buscado o suporte das pesquisas já realizadas no campo da ecologia de estradas. Por exemplo, em simulações desenvolvidas por JAEGER & FAHRIG (2004), a mortalidade se mostrou o componente determinante para a persistência de populações. A revisão realizada por FAHRIG & RYTWINSKI (2009) identificou que os principais grupos animais a sofrerem impactos negativos das estradas em termos de abundância foram os répteis, anfíbios e grandes mamíferos, nos quais a mortalidade se apresenta como elemento determinante da redução populacional. Também existe indicação de que a redução da diversidade genética está significativamente relacionada à mortalidade e não aos efeitos de barreira (JACKSON & FAHRIG 2011). Portanto, pode-se inferir que a evitar a mortalidade deve ser uma estratégia prioritária de mitigação. Adicionalmente, deve-se buscar restaurar o quanto possível a permeabilidade original do ambiente, de modo que os processos ecológicos se processem com a menor interferência do fator externo, a rodovia. Os conceitos de conectividade e permeabilidade também são importantes no planejamento da mitigação dos impactos das rodovias sobre a fauna. Entre as diversas definições encontradas na literatura, conforme expostos por COLLINGE (2009), HILTY et al. (2006) e LINDENMAYER & FISCHER (2006), por exemplo, podemos considerar a conectividade como um conceito baseado na terra, ou seja, as estruturas físicas que possibilitam o deslocamento entre dois ambientes. É importante introduzir o conceito de permeabilidade para que atinjamos a efetividade na aplicação das medidas mitigadoras. Baseado no animal, este conceito se relaciona aos caminhos e padrões de deslocamento, característicos das espécies e variáveis entre elas. Desta forma, mesmo oferecendo estruturas físicas (conectividade) podemos não estar propiciando permeabilidade, se não forem consideradas na definição de sua localização, tipo e
configuração, as características da comunidade faunística a que se destinam (BISSONETTE et al. 2007). Portanto, é essencial que a escolha das medidas mitigadoras esteja embasada em um diagnóstico prévio adequado, realizado conforme as recomendações do item 1.2. Diagnóstico ambiental.

No contexto da ecologia de estradas, em que os fragmentos considerados sempre estão bastante próximos, a princípio a situação parece menos complexa do que quando se pensa em estabelecer ligações entre fragmentos distantes, nos quais há que se prover um hábitat capaz de internamente manter comunidades e não apenas servir como corredor de passagem. Em corredores com pequena extensão, como as passagens de fauna que se pretende criar para mitigar a fragmentação provocada pela rodovia, parece ser suficiente que seus aspectos estruturais (inclinação, largura, altura), os mais importantes, segundo AHERN et al. (2009) e CLEVENGER & WALTHO (2005), permitam a movimentação dos animais, apresentem características que não venham a repelir sua utilização (luminosidade, cobertura vegetal, nível de ruídos, umidade, temperatura e substrato, por exemplo) e sua localização seja compatível com os hábitos e padrões de deslocamento das espécies às quais se destinam.

De acordo com o nível de organização que se pretende enfocar (espécie(s)-alvo ou comunidade, por exemplo) ou os efeitos que se deseja mitigar, diferentes ações devem ser consideradas. Por exemplo, se considerarmos que a redução ou eliminação de mortalidade por atropelamento é o essencial, a instalação de barreiras (cercas, muros ou meios-fios) é mais importante do que a disponibilização de passagens. Caso se identifique a necessidade de permitir o acesso a hábitats vitais, passagens que possam ser utilizadas por um variado espectro de espécies são a melhor alternativa a ser implantada. Se a fragmentação oferecer risco à manutenção de áreas mínimas de vida (home range) para as espécies existentes no local, devem ser propiciadas condições de passagem para que os indivíduos disponham de uma área compatível com suas características ecológicas. Se considerarmos apenas a manutenção da dinâmica de metapopulações, que pode ser obtida mesmo com o fluxo de um número reduzido de indivíduos por geração, AHERN et al. (2009) sustentam que esta pode ser mantida mesmo sem estruturas específicas de passagem, diferentemente das exigências quando o foco são indivíduos ou populações. Entretanto, como em certas situações a barreira formada por alguns tipos de rodovias pode inibir intensamente até este fluxo mínimo, é importante que se procure disponibilizar meios para que seja aumentada a probabilidade de ocorrência destes deslocamentos. Excetuando-se situações particulares, alguns princípios básicos devem nortear a tomada de decisão: os locais escolhidos devem possuir feições topográficas adequadas à movimentação de fauna, as estruturas devem ser passíveis de utilização pelo maior número de espécies possível, os hábitats a serem conectados devem ter viabilidade de conservação futura e integrarem uma rede mais ampla de corredores (BECKMANN et al. 2010).

A tomada de decisão, portanto, deve estar fundamentada claramente nas respostas aos questionamentos levantados, indicando quais os objetivos das medidas propostas, e como e onde devem ser implantadas. Adicionalmente, conforme abordado no item 3. Monitoramento, deve ser prevista a metodologia para avaliar a efetividade das mesmas, conferindo a desejável característica adaptativa ao processo, por meio de sua contínua reavaliação e eventual proposição de adequações.

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CONECTE - Guia de procedimentos para mitigação de efeitos de rodovias sobre a fauna
©2012 Mozart S. Lauxen e Andreas Kindel

Atualizado em: Tuesday, August 21, 2012